
Mário Fernandes
Universidade Lusófona *
Crescimento Económico, Capital Humano e a Economia Nacional
De entre a comunidade académica mundial, a nível dos estudos e investigações na área das ciências económicas, uma das questões deveras mais focadas terá sido, muito provavelmente, a questão do crescimento económico. Assim sendo, tal como em muitos outros aspectos, intimamente ligados à própria economia, nomeadamente as tendências ideológicas e académicas na investigação económica, a questão do crescimento económico tem permanecido em constantes evoluções, principalmente no que diz respeito ás questões associadas aos diversos modelos de crescimento económico. De forma simples e sintética, vamos perceber onde encaixar a questão do capital humano. Basicamente, até há cerca de três décadas atrás, os modelos de crescimento económico neoclássicos eram, de facto, os mais importantes a nível académico e, perante a realidade das economias mundiais, conseguiam explicar alguns aspectos fundamentais, mais precisamente no que diz respeito ás dinâmicas de acumulação de capital físico. Até essa data, eram tomados em consideração somente alguns factores produtivos, como sejam o capital físico, o trabalho e os recursos naturais. Robert Solow, já no ano de 1956, conseguiu reforçar as teorias de crescimento neoclássicas, particularmente com os pressupostos assumidos e com a inclusão do avanço do estado da tecnologia, o que até então não se tinha verificado. Por outro lado, este mesmo modelo de Solow foi, à data, revolucionário. Isto foi possível devido ao facto de estarmos em presença da análise dos crescimentos económicos das economias mais desenvolvidas e, contrariamente a estas, as menos avançadas. Já no final dos anos 80, e no início dos anos 90, Paul Romer, economista da universidade de Stanford, apresenta-nos a nova teoria do crescimento económico, que coloca o assento tónico no capital humano. Para Romer, a evidência microeconómica diz-nos que os salários serão tanto maiores com o número de anos investidos em educação e presentes no sistema de ensino. Assim, Romer advoga que o crescimento económico está intimamente associado ás externalidades positivas da educação, pelo que o existem um conjunto de quatro questões deveras importantes, ou seja, o investimento estatal na educação, o investimento das empresas em investigação e desenvolvimento (I&D), um maior aproveitamento dos recursos e competências para a inovação e, finalmente, a questão do learning-by-doing, ou do aprender-fazendo.
Assim, a evidência macroeconómica demonstra isto mesmo, isto é, os países que mais têm apostado nestes quatro pilares da educação e do conhecimento têm apresentado a justificação face ás questões da divergência no crescimento.
Neste aspecto, novamente, as economias nórdicas têm liderado a economia do conhecimento, através de fortes investimentos na educação e no sistema de ensino. A questão que importa colocar é a seguinte: será que Portugal, e por conseguinte os seus governantes e empresários, se aperceberam da consciência da importância da aposta no capital humano? Se sim, o que foi manifestamente feito e quais os seus resultados?
Inúmeras diferenças ocorreram no sistema de ensino nacional, em especial durante o último meio século. Até à alguns anos após o 25 de Abril, vigorava um sistema de ensino que, segundo alguns especialistas internacionais, se adequava ás necessidades das empresas nacionais e das principais indústrias. Esse tipo de ensino era focado, essencialmente, e no que diz respeito ao ensino profissional dessa altura, nas respectivas componentes comerciais e industriais, em particular com as escolas comerciais e industriais, onde os alunos que seguiam por esta via de ensino podiam especializar-se numa destas duas áreas. A área comercial e a área industrial ajustavam-se, assim, à realidade empresarial nacional. Porém, este tipo de ensino – manifestamente mais focado para a componente prática do sistema de ensino – não implicava reduções drásticas nos números de alunos no ensino superior. Sendo Portugal um país que sempre tivera presenciado uma baixa taxa de alunos no ensino superior, em especial ao compararmo-nos com os nossos vizinhos europeus, esse Portugal à data tivera o boom de admissões de discentes nas universidades públicas nacionais. Porém, já bem após Abril de 1974, o ensino profissional, de cariz comercial e industrial, acabaria por ser dado como terminado. Passar-se-ia, então, para um sistema de ensino manifestamente mais virado para algumas áreas do saber e das ciências, como são o caso da filosofia ou das ciências naturais ou económicas. Efectivamente, este novo ensino nacional iria permitir, sem quaisquer margens para dúvidas, uma maior e melhor preparação para um ensino superior nacional mais exigente e com os olhos colocados nas boas práticas académicas além fronteiras. Contudo, também se pôde constatar tremendos impactos no mercado de trabalho, mercado esse tão sensível em termos sociais. Com esta mudança ocorrida no sistema de ensino, verificou-se, também, a não profissionalização de todo um conjunto de postos de trabalho e de profissões, nomeadamente no que diz respeito ás profissões mais viradas para as áreas técnicas. Evidentemente, fez-se reflectir no mercado de trabalho nacional, atendendo, como não poderia deixar de ser, por via dos efeitos da lei da oferta e da procura. Esta questão só acabaria por ser resolvida já no século XXI, ou seja, com a mudança deste sistema de ensino e com a inclusão, tal como já acontecera muito antes do 25 de Abril, do ensino profissional e com as devidas equivalências ao ensino básico e secundário. Actualmente, existe ainda uma segunda vantagem – que não haveria sequer no anterior regime – que se prende com a possibilidade dos alunos que optem por esta via de ensino poderem, posteriormente, ingressar no ensino superior. Ora, esta mesma mudança terá duas componentes distintas, isto é, a face das vantagens para o mercado de trabalho e os impactos de custos na elaboração dos orçamentos de estado. Vamos começar com as vantagens; relativamente à questão do mercado de trabalho, a inclusão de um ensino profissional permite colmatar todo um conjunto de falhas anteriores, principalmente falhas relativas à não profissionalização de certos postos de trabalhos na economia nacional, nomeadamente postos de trabalho onde são exigidos conhecimentos de cariz mais técnicos, pelo que será expectável melhorias de eficiência e de produção em termos microeconómicos. Por outro lado, temos o impacto macroeconómico desta questão, isto é, com um sistema de ensino mais focado para a área profissional é esperado um maior número de alunos nestes cursos profissionais com equivalência legal à restante estrutural básica e secundário de ensino. Esta maior atractivamente permite que certo tipo de alunos permaneça no sistema de ensino, pelo que, um efeito de curto prazo para com o mercado de trabalho, será uma redução da taxa de desemprego. Isto acontece devido ao facto de que, muitos destes alunos, caso este ensino não existisse, entrariam no mercado de trabalho e, muito provavelmente, seriam mais uns a entrarem na contabilização da taxa de desemprego, já de si bastante elevada. Por outro lado, temos os custos – directos e indirectos – associados a esta mudança. Tal como mostra a figura abaixo indicada, temos a evolução do investimento do estado em educação. Note-se que, posteriormente a um período de um crescente nas despesas com a educação, temos, também, uma quebra neste mesmo tipo de despesas. Assim sendo, as reformas estruturais no sistema de ensino poderão funcionar como uma própria estabilização do investimento público na educação, o que só poderá ser visível a longo prazo.

Fonte: PORDATA – Base de Dados Portugal Contemporâneo
Na figura, temos ainda a evolução dos privados em investigação e desenvolvimento. Ao contrário da série pública, esta série permite-nos concluir que estamos numa tendência positiva no I&D. Uma leitura disto poderá ser o facto do sector produtivo nacional ter, finalmente, tomado consciência da aposta no capital humano como tentativa de maiores aumentos na produtividade total e média e, por outro lado, na criação de novos produtos nacionais que permitam, assim, atender a novos mercados nacionais e além fronteiras. Nas primeiras jornadas de economia, gestão e ciência política, ouvi um certo orador afirmar que em tempos de crise era necessário retirar o “s”, isto é, “em tempos de crise, crie!”. Por fim, no panorama nacional, temos ainda a questão do programa novas oportunidades. Muito se tem dito nesta matéria, referente a este programa, mas ainda é cedo para se fazer um balanço final relativamente ao impacto desta medida no quotidiano do sector empresarial e da própria economia. Os partidários das novas oportunidades argumentam a favor da necessidade imperativa de maiores qualificações dos trabalhadores, o que, de facto, faz todo o sentido. Contudo, a grande questão neste aspecto passa pela averiguação da exigência, credibilidade e dificuldade deste mesmo programa, relativamente ao sistema de ensino nacional, nomeadamente o ensino básico e secundário. Portanto, relativamente a esta questão, muitos especialistas advogam que existem, sim, uma maior facilidade no programa novas oportunidades, relativamente ao ensino convencional, o que nem mesmo a elevada experiência profissional daqueles que participam no programa, justificam tremenda falha face à exigibilidade dos quadros profissionais.
Porém, um aspecto está assegurado: se a educação e a economia do conhecimento estão intimamente relacionadas com o crescimento das economias mundiais, este mesmo maior investimento em capital humano apresenta, por um lado, um desenvolvimento pessoal para os cidadãos – que são o alvo desse investimento – mas também um desenvolvimento agregado social, para uma qualquer economia.
De facto, ao contrário dos modelos neoclássicos de crescimento económico, não existe produtividade marginal decrescente das ideias e da inovação, tal como acontecia no capital físico. Será esta a rota em que Portugal se direcciona? A haver uma estratégia nacional, este será um caminho obrigatório!
* Investigador do Observatório Lusófona de Actividades Económicas (OLAE) – Centro de Investigação da Universidade Lusófona